Atrevo-me a tocar nesta altura um ponto delicado. Vem
a propósito e é-me de certo modo imposto pela apresentação de um projecto do Deputado
Botelho Moniz na última sessão legislativa, relativamente à revogação das
chamadas leis do banimento, aplicável ao ramo português da Família de Bragança.
Em duas palavras direi sinceramente o que penso.
O País não tem interesse em ter urna monarquia para
três meses nem mesmo para três anos. Monarquia, República têm o seu interesse e
utilidade quando constituem a solução nacional do problema do regime e por essa
razão se estabilizam, permitindo tirar o máximo proveito da sua força
intrínseca ou virtudes específicas. Nestes termos um novo regime deveria surgir
por forma natural como correspondente ao estado social da Nação e à sua
compreensão do máximo problema político. Sendo questão tão transcendente, ela
só deveria ser resolvida pela razão esclarecida dos homens; é-o, em geral, num
sentido ou noutro, para infelicidade de todos, pela força das paixões. Mas a
questão do regime no está posta e não tem por isso que ser discutida. O que
interessa agora é saber se o projecto a que me referi tem com ela algum ponto
de contacto. E não tem. O Governo não
pode pôr objecções à revogação das leis do banimento porque ele próprio as tem
deixado cair no olvido e as considera sem valor pela sua não aplicação. Actos
públicos do maior relevo praticados com o consenso geral seriam incompatíveis
com interpretação diversa. A revogação expressa, dando sanção legal à prática
corrente, permitiria a permanência dos membros da Família de Bragança em
Portugal. Permitiria ainda — o
que para mim é mais importante do que simples reparação ou satisfação de um
sentimento —, permitiria a
educação em Portugal de príncipes portugueses. Vemos em circunstâncias mais
difíceis ter a questão sido considerada e começar a receber solução
satisfatória na Espanha e até em França, para não falar da larga, generosa
liberalíssima atitude do Brasil.
Príncipes portugueses só deveriam crescer e ser
educados em Portugal, embalados pelo nosso mar, acariciados pelo nosso sol,
falando de criancinha a Língua, sentindo a lusitanidade da terra e da gente,
vivendo o seu drama, acompanhando o seu trabalho, interpretando o seu sentir.
Príncipes assim educados, ao contacto dos vivos e dos mortos da sua pátria — dos que a
fizeram com heroísmo e a continuam com duro esforço —, são, seja qual for o seu
destino, património moral da Nação, património que só povos muito ricos ou
despreocupados costumam desperdiçar. Eu iria mesmo mais longe se não receasse
muito seriamente a incompreensão dos Portugueses; eu iria até ceder para aquele
fim o uso de um edifício do Património do Estado, digamos, o Paço dos Duques em
Guimarães, com beleza e com história, junto ao castelo de D. Afonso Henriques,
na cidade-mãe de Portugal.
Quem fala com esta
franqueza pode dizer mais o seguinte: seja qual for a atitude da próxima
Assembleia, libérrima neste como nos mais assuntos, e suposto que é a mais
larga, eu reputaria inconveniente para a tranquilidade da família portuguesa a
residência permanente no País do Senhor Dom Duarte Nuno. O seu alto critério
lho indicaria também. Não vale a pena aduzir razões porque procedem menos da
inteligência que da sensibilidade, e devemos respeitá-las.
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