sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Discurso de António de Oliveira Salazar



Atrevo-me a tocar nesta altura um ponto delicado. Vem a propósito e é-me de certo modo imposto pela apresentação de um projecto do Deputado Botelho Moniz na última sessão legislativa, relativamente à revogação das chamadas leis do banimento, aplicável ao ramo português da Família de Bragança. Em duas palavras direi sinceramente o que penso. 
O País não tem interesse em ter urna monarquia para três meses nem mesmo para três anos. Monarquia, República têm o seu interesse e utilidade quando constituem a solução nacional do problema do regime e por essa razão se estabilizam, permitindo tirar o máximo proveito da sua força intrínseca ou virtudes específicas. Nestes termos um novo regime deveria surgir por forma natural como correspondente ao estado social da Nação e à sua compreensão do máximo problema político. Sendo questão tão transcendente, ela só deveria ser resolvida pela razão esclarecida dos homens; é-o, em geral, num sentido ou noutro, para infelicidade de todos, pela força das paixões. Mas a questão do regime no está posta e não tem por isso que ser discutida. O que interessa agora é saber se o projecto a que me referi tem com ela algum ponto de contacto. E não tem.  O Governo não pode pôr objecções à revogação das leis do banimento porque ele próprio as tem deixado cair no olvido e as considera sem valor pela sua não aplicação. Actos públicos do maior relevo praticados com o consenso geral seriam incompatíveis com interpretação diversa. A revogação expressa, dando sanção legal à prática corrente, permitiria a permanência dos membros da Família de Bragança em Portugal. Permitiria ainda o que para mim é mais importante do que simples reparação ou satisfação de um sentimento , permitiria a educação em Portugal de príncipes portugueses. Vemos em circunstâncias mais difíceis ter a questão sido considerada e começar a receber solução satisfatória na Espanha e até em França, para não falar da larga, generosa liberalíssima atitude do Brasil. 
Príncipes portugueses só deveriam crescer e ser educados em Portugal, embalados pelo nosso mar, acariciados pelo nosso sol, falando de criancinha a Língua, sentindo a lusitanidade da terra e da gente, vivendo o seu drama, acompanhando o seu trabalho, interpretando o seu sentir. Príncipes assim educados, ao contacto dos vivos e dos mortos da sua pátria dos que a fizeram com heroísmo e a continuam com duro esforço —, são, seja qual for o seu destino, património moral da Nação, património que só povos muito ricos ou despreocupados costumam desperdiçar. Eu iria mesmo mais longe se não receasse muito seriamente a incompreensão dos Portugueses; eu iria até ceder para aquele fim o uso de um edifício do Património do Estado, digamos, o Paço dos Duques em Guimarães, com beleza e com história, junto ao castelo de D. Afonso Henriques, na cidade-mãe de Portugal. 
Quem fala com esta franqueza pode dizer mais o seguinte: seja qual for a atitude da próxima Assembleia, libérrima neste como nos mais assuntos, e suposto que é a mais larga, eu reputaria inconveniente para a tranquilidade da família portuguesa a residência permanente no País do Senhor Dom Duarte Nuno. O seu alto critério lho indicaria também. Não vale a pena aduzir razões porque procedem menos da inteligência que da sensibilidade, e devemos respeitá-las.

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