quinta-feira, 18 de setembro de 2014

A Pátria traída pela República

A Pátria traída pela República

Por Rodrigo Nunes (Batalha Final)


«A pátria traída pela República» é um artigo publicado por Jean Raspail no «Le Figaro» a 17 de Junho de 2004. Jean Raspail foi o autor de «Le Camp des Saints» que Samuel Francis considerou, juntamente com «1984» de Orwell e «Admirável Mundo Novo» de Huxley, uma das três obras proféticas sobre a derrocada do Ocidente. Neste artigo Raspail volta a pegar no tema proibido que eternizou «Le Camp des Saints», num tom de pessimismo, ou talvez realismo, que atravessa todo o texto, fazendo pesar sobre ele o desencanto de quem vê a pátria atraiçoada e numa marcha acelerada para a morte sem que aviste a reacção. A dado momento, porém, um assomo de esperança, sonha ainda a Reconquista… Texto com algumas reflexões fulcrais, sobre a essência da nação, que é carnal, como ele afirma sem lugar a dúvidas, sobre a distinção entre a nação e as formas de governo ou o Estado, sobretudo a distinção entre a natureza particular, identitária, da nação e a ideologia republicana, esta última universalista por excelência.

O artigo é de actualidade plena para toda a Europa, como Raspail confirma, mas sobretudo para Portugal, a analogia com o que sucede no nosso país é completa, dir-se-ia falar da nossa pátria, também ela traída pela República.

Para melhor enquadrar o artigo convém esclarecer que Jean Raspail é monárquico e tradicionalista católico. Adicionei também algumas notas explicativas que poderão eventualmente ser úteis a quem ler o texto. Aqui fica então:

Andei de volta deste tema como um treinador de um cão polícia em torno de uma bomba. Difícil de abordar de frente sem que vos expluda na cara. Há perigo de morte civil. É, no entanto, a interrogação capital. Hesitei. Ainda mais porque em 1973, ao publicar «Le Camp des Saints», já tinha dito, mais ou menos, tudo. Não tenho grande coisa a acrescentar excepto que o facto está consumado.

Porque estou convencido que o nosso destino de franceses está selado, porque «a minha casa é a casa deles» (Mitterrand), no seio de uma «Europa cujas raízes são tão muçulmanas quanto cristãs» (Chirac), porque a situação é irreversível até à transformação definitiva por volta de 2050 que verá os «franceses de gema» contarem-se somente entre a metade mais envelhecida da população do país, o resto será composto por africanos, magrebinos, ou negros e asiáticos de todas as proveniências saídos do reservatório inesgotável do terceiro-mundo, com forte predominância islâmica, jihadistas e fundamentalistas incluídos, essa dança está apenas a começar.

A França não é a única atingida. Toda a Europa marcha para a morte. As advertências não têm falta de relatórios da ONU (que se regozija), trabalhos incontornáveis de Jean-Claude Chesnais e Santiago Dupâquier, nomeadamente, mas são sistematicamente ocultados e o INED promove a desinformação. O silêncio quase sepulcral dos media, dos governos e das instituições comunitárias sobre o crash demográfico da Europa dos quinze é um dos fenómenos mais incríveis da nossa época. Quando há um nascimento na minha família ou na de amigos meus não consigo olhar esse bebé sem imaginar o que se prepara para ele na incúria dos «governos» e aquilo que deverá enfrentar na sua idade adulta…

Sem contar que os «franceses de gema», matraqueados pelo tam-tam lancinante dos direitos do homem, do «acolhimento do outro», da «partilha» cara aos nossos bispos, etc., enquadrados por todo um arsenal repressivo de leis ditas «anti-racistas», condicionados desde a infância para a «mestiçagem» cultural e comportamental, pelos imperativos da «França plural» e por todas as derivas da antiga caridade cristã, não terão outra alternativa que baixar as guardas e fundir-se sem protestar na nova massa citadina da França de 2050. Não desesperemos apesar de tudo. Seguramente subsistirão aqueles que chamamos em etnologia os «isolados», possantes minorias, talvez uns quinze milhões de franceses, e nem todos necessariamente de raça branca, que falarão ainda a nossa língua, na sua integridade mais ou menos salvaguardada, e insistirão em permanecer impregnados da nossa cultura e da nossa História, tal como nos foram transmitidas de geração em geração. Isto não lhes será fácil.

Face às diferentes «comunidades» que vemos formarem-se hoje sobre as ruínas da integração (ou antes sobre a sua inversão progressiva: somos nós que nos integramos no «outro», no presente, e não o contrário) e que em 2050 estarão definitivamente e sem dúvida institucionalmente instalados, tratar-se-á de certa forma, e procuro um termo apropriado, de uma comunidade da perenidade francesa. Esta apoiar-se-á sobre as suas famílias, a sua natalidade, a sua endogamia de sobrevivência, as suas escolas, as suas redes paralelas de solidariedade, talvez mesmo as suas zonas geográficas, as suas porções de território, os seus quarteirões, vejamos, os seus lugares de segurança e, porque não, a sua fé cristã, e católica com um pouco de sorte se esse cimento ainda valer.

Isso não agradará. O choque ocorrerá num momento ou noutro. Algo como a eliminação dos Koulaks por meios legais apropriados. E depois?

Depois a França não será mais povoada, sem distinção de origens, que por crustáceos que viverão em carapaças abandonadas pelos representantes de uma espécie já desaparecida que se chamava a espécie francesa e que não anunciava em nada a metamorfose genética que daria origem à espécie que na segunda metade deste século se apropriaria do seu nome. Este processo já começou.

Existe uma segunda hipótese que não saberia formular senão em privado e que exigiria antes que consultasse o meu advogado, é que os últimos «isolados» resistam até ao ponto de se aventurarem numa espécie de reconquista, sem dúvida diferente da espanhola mas inspirando-se nos mesmo motivos. Haveria um romance perigoso a escrever sobre isso. Não sou eu que me encarregarei de o fazer, eu já contribuí. O seu autor não é provavelmente ainda vivo, mas este livro verá o dia no momento justo, estou certo disso…

O que não consigo compreender e que me submerge num abismo de perplexidade aflitiva é porquê e como tantos franceses informados e tantos homens políticos franceses contribuem conscientemente, metodicamente, não ouso dizer cinicamente, para a imolação de uma certa França (evitemos o qualificativo de eterna que repugna as belas consciências) sobre o altar do humanismo utópico exacerbado. Coloco-me a mesma questão a propósito de todas estas associações omnipresentes de direitos daqui, direitos dacolá, e todas estas ligas, estas sociedades de pensamento, estas oficinas subvencionadas, estas redes de manipuladores infiltrados em todas as engrenagens do Estado (educação, magistratura, partidos políticos, sindicatos, etc.), estes peticionários inumeráveis, estes media correctamente consensuais e todos estes «inteligentes» que dia após dia e impunemente injectam a sua substância anestesiante no organismo ainda são da nação francesa.

Mesmo se posso, no limite, reconhecer-lhes uma parte de sinceridade, dá-se o caso de sentir pena de admitir que são meus compatriotas. Surge-me a palavra «renegado» mas há outra explicação: eles confundem a França com a República. Os «valores republicanos» declamam-se ad infinitum, sabemo-los até a exaustão, mas nunca com referências à França. Ora a França é em primeiro lugar uma pátria carnal. Pelo contrário a República, que não é mais que uma forma de governo, é sinónimo para eles de ideologia, ideologia com um «I» maiúsculo, a ideologia maior. Parece-me que, de qualquer maneira, traem a França pela República.

Entre o mar de referências que acumulo em espessos dossiers de apoio a este balanço há aqui uma que, debaixo da aparência inocente, ilustra bem a amplitude dos danos. É extraída de um discurso de Laurent Fabius ao congresso socialista de Dijon, em 17 de Maio de 2003: «Quando a Marianne dos nossos municípios assumir a bela face de uma jovem francesa saída da imigração, nesse dia a França haverá transposto um marco fazendo viver plenamente os valores da República…»

Posto que estamos em citações, eis aqui duas, para concluir: «nenhum número de bombas atómicas poderá impedir o maremoto constituído pelos milhões de seres humanos que partirão um dia da parte meridional e pobre do mundo para irromper nos espaços relativamente abertos do rico hemisfério setentrional, em busca de sobrevivência» (Presidente Boumediene , Março de 1974).

E esta, tirada do capítulo XX do Apocalipse: «O tempo dos mil anos termina. Saem as nações que estão nos quatro cantos da terra e que igualam em número a areia do mar. Elas partirão em expedição sobre a superfície da terra, avançarão sobre o campo dos santos e a cidade bem amada».

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