Por António José de Brito (In «Agora», n.º 329, ano VII, 04.11.1967)
Certos espíritos, que não são providos de inteligência em excesso, se ouvem alguns de nós declararem-se fascistas, costumam exibir um sorriso de imensa superioridade, exclamando: «Como é isso possível? O fascismo surgiu na Itália, logo é qualquer coisa de especificamente italiano: aliás o próprio Mussolini o reconheceu». Normalmente, tão inteligentes individualidades não têm conhecimentos suficientes para nos informarem quando e onde o Duce expressou tal opinião. Todavia há excepções e dentre as pessoas que exibem argumentos desta índole umas tantas não deixam de nos fulminar com a frase do discurso de 1923: «o fascismo é um fenómeno tipicamente italiano», com a declaração de 1925: «o fascismo não pode ser imitado», e, sobretudo, com a asserção de 1928: «o fascismo não é artigo de exportação».
Simplesmente o hábito de cavalheiros assim eruditos é esquecerem-se, com notável senso das oportunidades, de integrar as passagens citadas no contexto devido. É que se o fizessem já as afirmações do Duce não poderiam servir de argumento.
Em 1923, Benito Mussolini se considerou o fascismo um fenómeno tipicamente italiano, acrescentou logo em contrapartida: «mas bastantes dos seus princípios são universais». Em 1925, depois de dizer que o fascismo não pode ser imitado, esclareceu imediatamente: «assevero, todavia, que há no fascismo fermentos de vida cujo carácter universal não se pode negar». Quanto ao repto de 1928: «o fascismo não é artigo de exportação», além de não ser da autoria do Duce e não passar de aproveitamento de um lugar comum, repetido em determinados ambientes, foi proferido incidentalmente e tinha mero carácter polémico, consoante observou, muito bem, o Prof. Francesco Ercole. Em resposta a Mons. Seippel, que levantara a questão do Alto Adige, Mussolini replicou: «Que nos importam as lutas de candidaturas que haja na Europa? O fascismo não é artigo de exportação. Se a Europa quer infectar-se mais gravemente ainda das enfermidades de que nós já estamos curados, só nos fará estar mais vigilantes para defender-nos do contágio.»
O sentido das palavras de Mussolini é inequívoco. O fascismo não é coisa que a Itália tenha interesse propriamente em exportar como se tratasse de mercadoria. Quem desejar permanecer agarrado a erros já superados pelo fascismo, que permaneça. Tanto pior para ele. E acentue-se o seguinte: proclamar que a Europa, afastando-se do fascismo, agrava a sua doença é ter a convicção bem segura de que o fascismo é solução universal.
De qualquer modo, perante as interpretações habitualmente dadas a esse passo da resposta a Mons. Seippel, o Duce sentiu-se no dever de as corrigir. Em 1930, após esclarecer «A frase o fascismo não é artigo de exportação não é minha», solenemente garantia: «Aqui vai a rectificação. Hoje digo que o fascismo enquanto ideia, doutrina, realização, é universal; italiano nas suas instituições concretas, universal no espírito». E, em 1934, Mussolini insistia: «Desde 1929 até hoje o fascismo, de fenómeno italiano passou a fenómeno universal.» Era inteiramente verdade isso, na data em que foi dito, depois da subida do nacional-socialismo ao poder, e dos eventos desenrolados noutros países ainda. Fenómeno italiano até 1929, embora doutrina universal, nessa altura passou a ser doutrina e fenómeno universais. Claro que essa universalidade do fenómeno não excluía que os movimentos fascistas de todos os países tivessem características próprias e não se reduzissem a meras cópias.
Por consequência, a exegese do pensamento do Duce, em vez de fornecer um argumento a empregar contra os que, fora da Itália, se proclamam fascistas, vem tão só justificar as suas atitudes. Contudo, isto não é o suficiente para resolver a questão. Se Mussolini considerava o fascismo universal, nada nos garante, todavia, que se não enganasse.
Examinemos, rapidamente, o problema. Uma vez que o fascismo surgiu em Itália isso provará que tem de ser, necessariamente, italiano? Nem por sombras. Raciocinar desse modo seria confundir a ordem lógica com a ordem psicológica e genética. Não há sistema, filosofia, ideologia, que não tenha uma origem bem delimitada no espaço e no tempo. Iremos concluir daí que todas as doutrinas são relativas a circunstâncias dessa ordem e não as podem ultrapassar? A conclusão é impossível, porque, desde que falamos em todas as doutrinas, formulamos, já, uma doutrina de alcance geral e que excedeu o âmbito espácio-temporal da sua formulação, neste momento e nesta terra. Uma doutrina, se é um conjunto de ideias e valorações tem, por definição, o carácter das ideias e dos valores - a intemporalidade, a universalidade. Uma doutrina que se pretenda local e momentânea é afirmação, para todos e em termos ideais, de que não serve para todos, ou seja, é uma contradição em acto. E a doutrina que sustente que só há doutrinas de alcance particular é uma fórmula universal - dirigida a todos - que pretende abranger todas as concepções em acto.
Aliás porque se indignam tanto certos sujeitos contra a tese da universalidade do fascismo, se aceitam, de boa mente, que o absolutismo foi doutrina que se espalhou, simultaneamente ou quase, em diversas nações, e se não os escandaliza o facto do ideário de 1789 ser acatado, ainda agora, em boa parte do mundo, por gente das mais diversas raças, cores e religiões, apesar da sua procedência gaulesa e iluminista.
Quando vemos virtuosos patriotas (indignados contra os que, em Portugal, têm a coragem de se dizer fascistas) manifestarem a sua firme repulsa por tudo o que não for português de gema e castiço, ocorre-nos, sempre, este oportuno e certeiro comentário de Rafael Sanchez Mazas, no periódico Falange Española: «Nem Itália, nem Moscovo, Espanha!, clama uma voz tonitruante. Aplausos e silêncio. A seguir, a voz tonitruante tornou-se suave para expor umas pálidas e vagas teorias tardiamente da Revolução Francesa.»
Claro que há outro caminho, também, para negar a universalidade do fascismo. É contestar que este seja uma doutrina, reduzindo-o a simples agregado de disposições de objectivos restritíssimos, que não ultrapassavam a conjuntura italiana dos anos vinte e que, por isso, se tornava absurdo querer seguir em Portugal, na Bélgica, na Inglaterra, etc. No entanto isto não passaria de falsificação sem nome porque a doutrina fascista, enquanto conjunto de ideias e valorações, existe, incontestavelmente, encontrando-se expressa, sem equívocos, na súmula de Mussolini intitulada «Fascismo» e nas obras dos Gentile, dos Varisco, dos Binder, dos Krieck, dos Panunzio, dos Rocco, dos Coppola e muitos outros cujos trabalhos formam biblioteca.
E, de resto, se não fosse o fascismo uma doutrina universal, como se compreenderia que, por exemplo, em França, antes de 1939, funcionasse um Comité de Vigilance Anti-Fasciste e que, no momento presente, sejam constantes os ataques, as críticas — abjectas na sua maioria —, as propagandas anti-fascistas?
Morto Mussolini, morto Adolfo Hitler, morto Codreanu, morto José António, morto Szalassy, exilado e perseguido Degrelle, proibidos por lei, em toda a parte, partidos totalitários, não havendo mais um único Estado que, com propriedade, se possa considerar fascista, porquê a polémica incessante contra o fascismo, esmagado nos campos de batalha, se este não fosse um ensinamento permanente, dotado de universalidade que ameaça, como remorso perene, os seus inimigos?
Os que proclamam que o fascismo surgiu e morreu na Itália cobrem-no, simultaneamente, de insultos e doestos vivíssimos, com a paixão actual que ninguém dedica a coisas historicamente sepultadas como a conquista das Gálias ou as proezas de Saladino.
Significa isto que eles temem, ainda agora, o fascismo, embora, com fingido desdém, o classifiquem de cadáver. E temendo-o, mesmo depois de derrotado, prestam a melhor das homenagens à validade perene e ao carácter autenticamente universal da doutrina fascista.
Certos espíritos, que não são providos de inteligência em excesso, se ouvem alguns de nós declararem-se fascistas, costumam exibir um sorriso de imensa superioridade, exclamando: «Como é isso possível? O fascismo surgiu na Itália, logo é qualquer coisa de especificamente italiano: aliás o próprio Mussolini o reconheceu». Normalmente, tão inteligentes individualidades não têm conhecimentos suficientes para nos informarem quando e onde o Duce expressou tal opinião. Todavia há excepções e dentre as pessoas que exibem argumentos desta índole umas tantas não deixam de nos fulminar com a frase do discurso de 1923: «o fascismo é um fenómeno tipicamente italiano», com a declaração de 1925: «o fascismo não pode ser imitado», e, sobretudo, com a asserção de 1928: «o fascismo não é artigo de exportação».
Simplesmente o hábito de cavalheiros assim eruditos é esquecerem-se, com notável senso das oportunidades, de integrar as passagens citadas no contexto devido. É que se o fizessem já as afirmações do Duce não poderiam servir de argumento.
Em 1923, Benito Mussolini se considerou o fascismo um fenómeno tipicamente italiano, acrescentou logo em contrapartida: «mas bastantes dos seus princípios são universais». Em 1925, depois de dizer que o fascismo não pode ser imitado, esclareceu imediatamente: «assevero, todavia, que há no fascismo fermentos de vida cujo carácter universal não se pode negar». Quanto ao repto de 1928: «o fascismo não é artigo de exportação», além de não ser da autoria do Duce e não passar de aproveitamento de um lugar comum, repetido em determinados ambientes, foi proferido incidentalmente e tinha mero carácter polémico, consoante observou, muito bem, o Prof. Francesco Ercole. Em resposta a Mons. Seippel, que levantara a questão do Alto Adige, Mussolini replicou: «Que nos importam as lutas de candidaturas que haja na Europa? O fascismo não é artigo de exportação. Se a Europa quer infectar-se mais gravemente ainda das enfermidades de que nós já estamos curados, só nos fará estar mais vigilantes para defender-nos do contágio.»
O sentido das palavras de Mussolini é inequívoco. O fascismo não é coisa que a Itália tenha interesse propriamente em exportar como se tratasse de mercadoria. Quem desejar permanecer agarrado a erros já superados pelo fascismo, que permaneça. Tanto pior para ele. E acentue-se o seguinte: proclamar que a Europa, afastando-se do fascismo, agrava a sua doença é ter a convicção bem segura de que o fascismo é solução universal.
De qualquer modo, perante as interpretações habitualmente dadas a esse passo da resposta a Mons. Seippel, o Duce sentiu-se no dever de as corrigir. Em 1930, após esclarecer «A frase o fascismo não é artigo de exportação não é minha», solenemente garantia: «Aqui vai a rectificação. Hoje digo que o fascismo enquanto ideia, doutrina, realização, é universal; italiano nas suas instituições concretas, universal no espírito». E, em 1934, Mussolini insistia: «Desde 1929 até hoje o fascismo, de fenómeno italiano passou a fenómeno universal.» Era inteiramente verdade isso, na data em que foi dito, depois da subida do nacional-socialismo ao poder, e dos eventos desenrolados noutros países ainda. Fenómeno italiano até 1929, embora doutrina universal, nessa altura passou a ser doutrina e fenómeno universais. Claro que essa universalidade do fenómeno não excluía que os movimentos fascistas de todos os países tivessem características próprias e não se reduzissem a meras cópias.
Por consequência, a exegese do pensamento do Duce, em vez de fornecer um argumento a empregar contra os que, fora da Itália, se proclamam fascistas, vem tão só justificar as suas atitudes. Contudo, isto não é o suficiente para resolver a questão. Se Mussolini considerava o fascismo universal, nada nos garante, todavia, que se não enganasse.
Examinemos, rapidamente, o problema. Uma vez que o fascismo surgiu em Itália isso provará que tem de ser, necessariamente, italiano? Nem por sombras. Raciocinar desse modo seria confundir a ordem lógica com a ordem psicológica e genética. Não há sistema, filosofia, ideologia, que não tenha uma origem bem delimitada no espaço e no tempo. Iremos concluir daí que todas as doutrinas são relativas a circunstâncias dessa ordem e não as podem ultrapassar? A conclusão é impossível, porque, desde que falamos em todas as doutrinas, formulamos, já, uma doutrina de alcance geral e que excedeu o âmbito espácio-temporal da sua formulação, neste momento e nesta terra. Uma doutrina, se é um conjunto de ideias e valorações tem, por definição, o carácter das ideias e dos valores - a intemporalidade, a universalidade. Uma doutrina que se pretenda local e momentânea é afirmação, para todos e em termos ideais, de que não serve para todos, ou seja, é uma contradição em acto. E a doutrina que sustente que só há doutrinas de alcance particular é uma fórmula universal - dirigida a todos - que pretende abranger todas as concepções em acto.
Aliás porque se indignam tanto certos sujeitos contra a tese da universalidade do fascismo, se aceitam, de boa mente, que o absolutismo foi doutrina que se espalhou, simultaneamente ou quase, em diversas nações, e se não os escandaliza o facto do ideário de 1789 ser acatado, ainda agora, em boa parte do mundo, por gente das mais diversas raças, cores e religiões, apesar da sua procedência gaulesa e iluminista.
Quando vemos virtuosos patriotas (indignados contra os que, em Portugal, têm a coragem de se dizer fascistas) manifestarem a sua firme repulsa por tudo o que não for português de gema e castiço, ocorre-nos, sempre, este oportuno e certeiro comentário de Rafael Sanchez Mazas, no periódico Falange Española: «Nem Itália, nem Moscovo, Espanha!, clama uma voz tonitruante. Aplausos e silêncio. A seguir, a voz tonitruante tornou-se suave para expor umas pálidas e vagas teorias tardiamente da Revolução Francesa.»
Claro que há outro caminho, também, para negar a universalidade do fascismo. É contestar que este seja uma doutrina, reduzindo-o a simples agregado de disposições de objectivos restritíssimos, que não ultrapassavam a conjuntura italiana dos anos vinte e que, por isso, se tornava absurdo querer seguir em Portugal, na Bélgica, na Inglaterra, etc. No entanto isto não passaria de falsificação sem nome porque a doutrina fascista, enquanto conjunto de ideias e valorações, existe, incontestavelmente, encontrando-se expressa, sem equívocos, na súmula de Mussolini intitulada «Fascismo» e nas obras dos Gentile, dos Varisco, dos Binder, dos Krieck, dos Panunzio, dos Rocco, dos Coppola e muitos outros cujos trabalhos formam biblioteca.
E, de resto, se não fosse o fascismo uma doutrina universal, como se compreenderia que, por exemplo, em França, antes de 1939, funcionasse um Comité de Vigilance Anti-Fasciste e que, no momento presente, sejam constantes os ataques, as críticas — abjectas na sua maioria —, as propagandas anti-fascistas?
Morto Mussolini, morto Adolfo Hitler, morto Codreanu, morto José António, morto Szalassy, exilado e perseguido Degrelle, proibidos por lei, em toda a parte, partidos totalitários, não havendo mais um único Estado que, com propriedade, se possa considerar fascista, porquê a polémica incessante contra o fascismo, esmagado nos campos de batalha, se este não fosse um ensinamento permanente, dotado de universalidade que ameaça, como remorso perene, os seus inimigos?
Os que proclamam que o fascismo surgiu e morreu na Itália cobrem-no, simultaneamente, de insultos e doestos vivíssimos, com a paixão actual que ninguém dedica a coisas historicamente sepultadas como a conquista das Gálias ou as proezas de Saladino.
Significa isto que eles temem, ainda agora, o fascismo, embora, com fingido desdém, o classifiquem de cadáver. E temendo-o, mesmo depois de derrotado, prestam a melhor das homenagens à validade perene e ao carácter autenticamente universal da doutrina fascista.
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